quinta-feira, 2 de maio de 2013

Por que as Pessoas Deixam a Fé (apostasia)

 

Apostasia é um nome muito forte para o que acontece normalmente com uma pessoa quando ela deixa a fé pouco depois de dar os seus primeiros passos com Deus. Apostasia é deliberada e consciente negação da fé. A maioria das pessoas que abandonam a fé, não o fazem por simples rebeldia, saem por que não encontraram aquilo que procuravam ou procuravam aquilo que com certeza não encontrariam em uma igreja.
Nesse artigo vamos explorar algumas das principais ideias de Peter Scazzero em seu livro “Emotionally Healthy Spirituality” (Espiritualidade Emocionalmente Sadia) e a relação que a saúde emocional e vigor espiritual tem a ver com o abandono da fé. O autor inicia o seu livro com uma declaração pelo menos contundente e desafiadora: “saúde emocional e maturidade espiritual são inseparáveis!” p.12. ou “não há como ter uma espiritualidade desenvolvida com as emoções doentes.
Expectativas Frustradas
Quando as pessoas vêm para a igreja, elas têm uma esperança de que a sua situação como pessoa será melhorada. Tudo o que está relacionado com Deus inspira a ideia de que vai haver uma transformação. As promessas são fortes e incisivas: “Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo.” 2 Co. 5:17. “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim.” Gl. 2:20.
Não conheço uma pessoa sequer em são juízo que não queira experimentar ser uma nova criatura! Mas o que acontece? As pessoas experimentam essa nova vida? Essa melhora considerável ocorre? É de fato percebida essa transformação na vida da pessoa que está recebendo a instrução bíblica?
Até um tempo atrás, na era moderna, as pessoas percebiam essa melhora por meio de uma compreensão intelectual aprimorada das coisas. A igreja fornecia essa percepção. Quanto mais compreensão elas tinham das coisas, mais elas sentiam que houve progresso em suas vidas. Não era uma época de menos emoções ou necessidades emocionais, mas o foco não estava nas emoções, no sentir-se bem. Para conquistar aquilo que era necessário num mundo a ser desbravado (condição típica da época), as pessoas negavam as suas emoções e enfrentavam as lutas, desafios e desconfortos.
As pessoas não eram valorizadas por suas habilidades emocionais tanto quanto por suas consecuções práticas, por suas contribuições à sociedade ou pelo poder pensante. O intelecto produtivo era valorizado bem como a capacidade de pensar tanto teoricamente (construindo teorias que explicassem o mundo ao redor) como – principalmente – pensar praticamente (invenção do telefone, do telégrafo, da lâmpada, do motor, etc.).
Nesse ambiente não havia disponibilidade de informações para as pessoas comuns, como a temos hoje. Não havia meios de divulgação das conquistas e o fluxo de informações era muito fraco. A igreja era, para a maioria das pessoas a principal provedora de informações e as pessoas vinham pois ali havia informação. O ambiente da igreja, por escassez de ofertas do mundo, era a principal meio de divulgação e o pastor era autoridade na comunidade – respeitado e aclamado – pelo fato de ser propagador da informação. Quando uso o termo informação, não estou apenas me referindo à informação bíblica, mas à informação de modo geral. Cartas eram lidas do púlpito, informações do campo missionário vinham por meio de uma instituição forte, que era capaz de fazer o transporte da informação, referências às grandes conquistas eram feitas do púlpito. Escritores da igreja ofereciam uma compreensão do mundo e daquilo que estava acontecendo nele.
Assim quando a pessoa vinha para a igreja, em sua percepção modelada pela época em que vivia, recebia o que estava procurando – desenvolvimento pessoal. Além disso recebia senso de comunidade, de pertencimento, de sentido para a vida – pois era o que o conhecimento da verdade fazia, tinha uma causa pela qual lutar e participava de uma igreja, que na época era um item de valor social elevado.
A sociedade continuou a se desenvolver colhendo os resultados de seu avanço tecnológico. Entraram as duas guerras mundiais que produziram máquinas capazes de exterminar com muito mais rapidez e eficácia. As guerras também provocaram uma mudança de mentalidade, e correntes filosóficas foram surgindo para alcançar algum tipo de compreensão daquilo que havia acontecido e estava acontecendo.
Passadas as guerras, ninguém queria mais morticínio e sofrimento daquela maneira. Os terrores das duas guerras mundiais, criaram na sociedade ocidental uma ojeriza a desconforto, conflitos e destruição… Havia uma consciência magnificada do mal que tanto conhecimento poderia causar – a ciência foi utilizada para destruir e matar durante as guerras.
O conhecimento não havia trazido apenas os males, e a sociedade, como um movimento sócio-cultural antagônico às lutas e sofrimentos das guerras, foi indo na direção de desfrutar do conforto e facilidades que a modernidade e todo o conhecimento acumulado então haviam conquistado.
Quando as pessoas estão na luta pela sobrevivência e por desbravar o básico da vida e do conhecimento, elas não tem disposição e nem descobriram a possibilidade de “se sentirem bem”.
A Pirâmide de Maslow (acima) explica essa busca do ser humano. Enquanto as necessidades mais básicas (na base da pirâmide) ainda não estão supridas, o ser humano luta por supri-las. Conforme elas vão sendo atendidas, o ser humano busca a satisfação do próximo nível de necessidades, até que tenha condições de dar atenção às coisas elevadas da vida, sentido, propósito, etc.
O momento em que vivemos na história da humanidade, coloca a disposição de uma boa parcela da sociedade o conforto e as facilidades conquistadas de maneira que supram as necessidades básicas dos indivíduos. Finalmente podem eles se preocupar com outras facetas da existência, como por exemplo a qualidade de vida e como se sentem em relação às realidades do mundo.
Necessidades supridas
Como queremos continuar suprir através da igreja o que já está suprido? Como ousamos não suprir o que mais as pessoas estão realmente precisando? Por que é tão difícil repensar religião de tempos em tempos sem perder identidade? Não é isso que seria necessário para explicar quem é Deus para cada geração, assim como ela melhor consegue entender?
O que as pessoas mais necessitam hoje? O que validaria a religião Cristã no tempo do fim como algo real e imprescindível para a vida das pessoas em nossa sociedade?
Na época do modernismo religião era apresentada em forma de informação. De alguma maneira havia uma ligação entre mente e vida, que fazia com que as pessoas, mediante a informação, conseguissem tomar decisões para a sua vida e vivê-la para Deus. De alguma maneira essa ligação era mais eficaz do que hoje nas pessoas. As pessoas sentiam ter alcançado na igreja aquilo que procuravam, quando recebiam informações úteis e necessárias para o seu dia a dia. Assim a igreja cumpria com o seu papel!
Não sei se a degeneração típica de todas as coisas (lei da entropia de Newton), ou se a “moda” simplesmente mudou, ou se as pessoas , como uma típica reação à fase anterior se cansam de uma abordagem e buscam coletivamente outra maneira de viver… Só sei que hoje não funciona mais a abordagem meramente intelectual/cognitiva, por meio da argumentação lógica.
O acesso à informação foi providenciado amplamente por todos os meios de comunicação que existem hoje e todo o conhecimento necessário está praticamente na palma da mão de cada indivíduo. No celular podemos ter todas as informações que queremos à distância de dois ou três cliques…
Novos tempos, novas abordagens
Não estou propondo a psicologização do púlpito, nem quero transformar a igreja em um grupo de terapia psicológica. Mas esses elementos, em minha compreensão e na compreensão de Peter Scazzero, precisam receber maior atenção hoje do que no passado. Se fôssemos pensar de maneira institucionalizada, precisaríamos de um departamento de aconselhamento ou de terapia familiar. Se pensarmos como era pós-moderna, precisamos nos organizar como igreja para conversar com as pessoas e ajudá-las a achar cura interior e vigor espiritual.
Sou a favor que do púlpito seja pregada a Palavra de Deus. Bíblia aberta e discutida com o povo. A maneira talvez que o fazemos seja menos terapêutica do que precisamos fazer hoje. A Palavra de Deus é a Sua revelação de Si como Pessoa e é conteúdo revelado que tem uma proposta, que tem claras proposições orientadoras para o ser humano. Na Bíblia está revelado claramente o que Deus fez e faz pelo ser humano, o que o ser humano deve fazer para ter uma vida útil para o Reino de Deus e o que ele deve fazer para ser feliz aqui na terra e se preparar para a vida eterna.
Creio que em nossa época precisamos da Bíblia mais do que em qualquer outra época. Peter Scazzero afirma que uma espiritualidade contemplativa tem ligação direta com uma vida espiritual emocionalmente sadia. O livro O Desejado de Todas as Nações nos chama a fazer exatamente isso: “Far-nos-ia bem passar diariamente uma hora a refletir na vida de Jesus. Devemos tomá-la ponto por ponto, e deixar que a imaginação se apodere de cada cena, especialmente as finais.” DTN, 83. Outros livros de Ellen White também o fazem: “A verdade divina deve ser objeto de sua contemplação e meditação.” AA, 475. “Em todo o vosso trabalho deixai evidente que conheceis Jesus. Apresentai Sua pureza e graça salvadora, de maneira que aqueles por quem trabalhais, possam pela contemplação, ser mudados na imagem divina!” BS, 92. “Cristo em Sua abnegação, Cristo em Sua humilhação, Cristo em Sua pureza e santidade, Cristo em Seu incomparável amor – este é o tema para a contemplação da alma. É amando-O, imitando-O, confiando inteiramente nEle, que haveis de ser transformados na Sua semelhança.” CC, 71.
Conduzir as pessoas para um desenvolvimento integral de seu ser, é o que mais as pessoas buscam. Uma espiritualidade contemplativa pode oferecer a experiência que tanto os pós-modernos buscam, e podem simultaneamente produzir a cura que eles estão esperando que a religião vai lhes oferecer – cura interior! Ao mesmo tempo as pessoas são elevadas a um patamar de maturidade espiritual, como descrito nos artigos da seção ESPIRITUALIDADE – clique aqui abrir.
Não me parece que o processo de aquisição de conhecimento é excluído aqui, mas não mais pode ser usado como um fim em si mesmo e mais como um meio de produzir cura. A revelação clara de Deus é o meio mais necessário para a transformação das pessoas – isso não muda e nunca mudará, mas a maneira como apresentamos esse conteúdo parece que precisa ser direcionada para o impacto mais holístico sobre as pessoas, justamente para transformar e confirmar a transformação das pessoas de maneira mais intencional, menos atomatista como era feito no período moderno.
O confronto com as outras religiões, e a exploração que fazem de elementos de religião mágica, pagã, não é opção para nós adventistas. Apenas repetir o que outros estão fazendo não me parece ser a maneira ideal de levar as pessoas à maturidade espiritual que estão buscando, mesmo vendo um aparente sucesso das outras religiões. Imitar movimentos populistas ou mesmo igrejas que exploram ao extremo a teologia da prosperidade (paganismo disfarçado de cristianismo) pode trazer pessoas, mas não as supre daquilo que realmente vieram busca e principalmente não é aquilo que as levará para uma vida abundante em Cristo (Jo. 10:10).
Recomendamos um livro de Peter Drucker, que não tem nada diretamente a ver com o assunto da apostasia, mas ele faz um raio-X daquilo que que as pessoas vêm buscar em uma igreja: Administração de Organizações sem Fins Lucrativos. Elas vêm buscar desenvolvimento integral – corpo, mente, espírito – e a igreja precisa se estruturar para atender as pessoas da pós-modernidade em suas necessidades com o mesmo evangelho eterno.
Precisamos fazer o nosso trabalho com responsabilidade diante de Deus. Precisamos fazê-lo como indivíduos e como instituição! Precisamos expandir e apresentar o Reino de Deus a muitas pessoas e ter o máximo de conversos, mas precisamos nos organizar de tal maneira que essas pessoas sejam levadas à maturidade espiritual em Cristo, “à medida da estatura de Cristo.” (veja Ef. 4: 8-20).
Veja a seção “discipulado” nesse site. Essa é a melhor maneira de experimentarmos o crescimento espiritual que as pessoas estão buscando.
Dr. Berndt Wolter

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